Quetzalcóatl e suas manifestações na Mesoamérica |
Texto de Alexandre Guida Navarro |
Resumo
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Palavras-chave: divindade, documentos escritos, conquista do México. 1. Etimologia da palavra Na Mesoamérica, a combinação de um deus e um herói civilizador produziu um universo de representações e imagens iconográficas complexas (Campbell, 1959). Quetzalcóatl faz parte deste universo. Sua figura mítica representa um alto grau de complexidade cultural: tem a qualidade de renascer em todas as épocas, mostrando-se em cada uma delas com uma imagem iconográfica distinta ou modificada e recoberta de novos significados, sintetizados em uma profusão de imagens que caracterizam sua presença em toda a Mesoamérica. 2. As manifestações de Quetzalcóatl A caracterização da iconografia mesoamericana, em especial a maia, é marcada por traços e motivos representados pela serpente. Grande parte dos estudos que desta natureza mostra que a serpente dá origem aos símbolos mais importantes dentro da imagética pré-hispânica. |
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O motivo ofidiano está relacionado a uma crença de natureza divina da serpente e sua representação indica a elaboração de um culto ao que ela representa. Parece ser que a representação da serpente e sua relação com as mais diversas variáveis culturais estiveram presentes em diversos contextos mesoamericanos e com os mais diversos significados. Segundo De La Garza (1984), acerca das características biológicas da serpente, causam admiração e medo ao ser humano; espantam pela sua rapidez e agilidade, apesar de não possuírem patas; surpreendem também pela sua língua bifurcada, por sua visão fixa, ausente de pálpebras e fundamentalmente por sua vitalidade que se manifesta nos seguintes aspectos: renovação periódica de sua pele, permanece sem comer ou tomar água durante muito tempo, cresce durante toda sua vida, mostra uma notável resistência ao morrer quando está gravemente ferida, tem um modo muito peculiar de acasalamento, além de se assemelhar ao falo, princípio da vida por excelência. |
Este mesmo princípio de vitalidade pode ser evidenciado pela descrição do ornitólogo Alexander Skutch, em relação à ave quetzal: “La cabeza completa y la parte superior de su plumaje, la garganta y el pecho, son de un intensoverde brillante. La parte inferior del pecho, 2.2. Vênus |
2.3 Ehécatl ou 9 Vento A divindade 9 Vento, aparentemente, é um dos deuses criadores das religiões do período Pós-Clássico (Figura 2. Ehécatl. Em Florescano, 1995: 34). Contudo, seu registro mais antigo provém da região maia. Chan Bahlum, o rei de Palenque em 690 d.C. registrou no que hoje conhecemos como textos do Conjunto da Cruz, a origem dos cosmos e dos deuses. Segundo estes textos, o Primeiro Pai e a Primeira Mãe, após criarem o céu e dar início ao tempo em 13 de agosto do ano de 3114 a.C. (4 Ahau 8 Cumku), geraram três deuses, que é a famosa Tríade dos protetores de Palenque. O Deus I nasceu no dia 9 Ik, ou Nove Vento, e está associado à Vênus e ao sacrifício por decapitação. |
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Alfonso Caso (1977) foi o primeiro estudioso a oferecer as características de 9 Vento a partir dos estudos dos códices mixtecos, em que a presença desta divindade revela um culto fora do Altiplano Central. Segundo este pesquisador, o nascimento de 9 Vento está associado à ordenação cósmica e temporal, além do começo de uma nova era. Considera que os traços típicos de 9 Vento são a guerra, o canto, a escrita, o sacrifício e as cerimônias religiosas. |
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No entanto, repentinamente, este reino mítico sofreu uma turbulência interna que os textos descrevem como uma hecatombe apocalíptica. Ce Ácatl Topiltzin Quetzalcóatl, o sacerdote exemplar, infringiu o código de conduta estabelecido por ele mesmo, abandonou seus deveres, rompeu as normas de abstinência e castidade, caindo na embriaguez e prazeres carnais. Esta crise está relacionada à presença perturbadora de Tezcatlipoca, uma divindade que desde o tempo da criação era o antagonista de Quetzalcóatl. Tezcatlipoca intervém diretamente na decadência de Quetzalcóatl e provoca o clima de caos do reino de Tula, levando-a a ruína. Segundo os textos e principalmente nas palavras de Sahagún (1956), estas catástrofes já eram esperadas, o que causava grande pavor nos habitantes de Tula. Assim, Tezcatlipoca aplicou suas artes maléficas para conduzir os toltecas à morte distribuindo pestes, secas, geadas, fome, guerras e mortandades coletivas. Agoniado pela sua própria ruína e pelas desgraças que aconteciam em seu reino, |
Topiltzin Quetzalcóatl decidiu abandonar Tula (Figura 3. A fuga de Quetzalcóatl desde Tula. Em Florescano 1995: 268). |
Bibliografia ANDREWS IV, E. WYLLYS; ANDREWS V, WYLLYS. Excavations at Dzibilchaltún, Yucatán, BERRIN, Kathleen (comp.). Feathered Serpents and Flowering Trees. Reconstructing the CASO, Alfonso. Reyes y reinos de la Mixteca. México: Fondo de Cultura Económica, 1977. CLANDINNEN, Inga. Aztecs: an Interpretation. Cambridge: Cambridge University Press, 1991. COBOS, Rafael P. “El Centro de Yucatán: de área periférica a la integración de la comunidad DE LA GARZA, Mercedes. El universo sagrado de la serpiente entre los mayas. México: UNAM, DAVIES, Nigel. The Toltecs. Norman: University of Oaklahoma Press, 1980. DIEHL, Richard A. “Tula”. In: Supplement to the Handbook of Middle American Indians, FLORESCANO, Enrique. El mito de Quetzalcóatl. México; Fondo de Cultura Económica, 1995. GRAULICH, Michel. Quetzalcóatl y el espejismo de Tollan. Amberes: Institute voor LÓPEZ AUSTIN, Alfredo. Hombre-Dios. Religión y oolítica en el mundo náhuatl. México: MARQUINA, Ignacio. Arquitectura prehispánica. México: Instituto Nacional de Antropología y NAVARRO, Alexandre Guida. O retorno de Quetzalcóatl: o culto à divindade a partir da NICHOLSON, Henry B. “The Deity 9 Wind ‘Ehécatl-Quetzalcóatl’ in the Mixteca Pictorals”. In: PAZTORY, Esther. “Artistic Traditions of the Middle Classic Period”. In: Middle Classic PENICHE RIVERO, Piedad. Sacerdotes y comerciantes: el poder de los mayas e itzáes de ROBLES CASTELLANOS, Fernando. La Secuencia Cerámica de la Región de Cobá, SAHAGÚN, Fray Bernardino. Historia General de las Cosas de Nueva España. México: Porrúa, SCHELE, Linda; FREIDEL, David. A Forest of Kings. The Untold Story of the Ancient Maya. Nova SCHOLES, France; ROYS, Ralph L. The Maya Chontal Indians of Acalan-Tixchel. A SPRAJC, Ivan. Venus, lluvia y maíz: simbolismo y astronomía en la cosmovisión TAUBE, Karl. “The Temple of Quetzalcóatl and the Cult of Sacred War at Teotihuacán”. In: RES 21, pp. 53-87. Washington: Dumbarton Oaks Research Library and Collection, 1992. THOMPSON, Eric S. Historia y religión de los mayas. México: Siglo XXI, 1975. |
Alexandre Guida Navarro é Historiador. Mestre em Arqueologia pela USP. Doutor em Antropologia/Arqueologia pela UNAM, México. Atualmente realiza Pós-Doutorado no Núcleo de Estudos Estratégicos (Unicamp). Email: altardesacrificios@yahoo.com.br |